quarta-feira, 31 de outubro de 2012

Sonoro

Desde a noite quente
Do barulho do ventilador insistente
Que ajuda a refrescar pesadelos e sonhos
Enquanto os sons milhares da noite acalmam e assolam a mente

Até os cantos de pássaros matinais
Até os perfumes florais
Invasores do silêncio profundo
Que havia antes da beleza que o pôr-do-sol traz

A vida acordando...
Passos vagos pelas ruas
Onde a rotina continua
Como sempre na luta se vivia
Dia após dia

A multidão despertando
No outono, folhas farfalhando
Na primavera, flores brotando
No verão, sol iluminando
No inverno, frio reverberando...

As vozes baixas de sono enquanto
Não estalam-se os ossos do merecido descanso
Que pousa sob a lua num terno carinho manso
No som do amor dos grilos, no som do vento brando

O caminho alongado à vida central
Rodas no chão, buzinas no ar, carros parados no sinal
Atravessam os corpos ainda preguiçosos
Repletos de sonhos, planos, pensamentos desditosos

Vem o velhinho com seu leve caminhar
De bengala na mão, com mil lembranças no olhar
Atrás, um pobre de um cão cansado
Que teve a noite perturbada por frio e fome por todo lado
Ouve-se as ecoantes gargalhadas dos jovens
Na mocidade comprovada pelo brilho dos olhos
Que ofuscam as desesperanças velhas de quem pensa não mais ter jeito
De quem tem certeza de um mundo sufocado de defeitos

No meio dessa musicalidade natural
Existe maior uma voz que não se ouve
Só se sente na frequência das batidas do coração
Nas rotações por minuto em decibéis inescutáveis

Uma voz que grita, que sufoca, que ensurdece
Um grito abafado, de socorro, que entontece
Eterno, indefensável, mas bom de se escutar
Que invade cada célula dos corpos acordados
Na dificuldade de conjugar aquele verbo... 'Acreditar'

É aquela voz que te implora com toda força que há
"Não desista... Não desista de tentar
 Siga em frente, pode ir, te dou a mão
 Logo ali na frente seus sonhos te encontrarão"
Então se esquece os pássaros, as flores, os tiros, o farfalhar
E concentra todo o ouvir na doçura dessa voz

Que só quer te ver crescer
Que torce pelo vencer
Que chora no derrotar
Mas te levanta do chão
Que não solta da sua mão
E ilumina o caminhar
Até sua hora chegar
Até o caminho acabar
Até que se consiga
Depois de todas as cicatrizes e feridas
Seus sonhos realizar.









terça-feira, 25 de setembro de 2012

Sobretudo

Sobre as coisas que envolvem
Sobre as coisas que encantam
Sobre a simplicidade dos dias que passam

Sobretudo...
Sobre tudo o que se vê
Sobre tudo o que se sente
Sobre tudo de você

Diferente de tudo sobre o que já se viu
Tudo que ficou gravado com carinho nessa mente
Que esquece parte do importante
Que não lembra de nada do que vê pela frente

Pessoas, lugares, ruas e trajetos
Atenção para os detalhes
Inúmeros detalhes, inúmeros flagelos
Detalhes como bolhas de sabão
Que se perdem no vento deixando nada pra trás
Evaporando em sucessivos estouros pelo chão

Tentar lembrar do mais vago quanto possível
Nesse fundo subconsciente
No sobretudo da ideia nascente
Notando enfim que o valioso vive em todas as coisas
Que o milagroso habita no vazio
Em tudo o que se vê, em tudo o que se sente
Em tudo o que passa, em tudo o que estoura
E deixa nada
Pra trás, pra frente...
Pra sempre

Nas flores sem perfume
Nos mares sem brisa
Nos dias sem cores
Nas casas sem janelas
Nas falhas sem dores

Em tudo que existe
Qualquer coisa que persiste
Há beleza de se ver
Há milagre em perceber
Sobretudo, em você


quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Conexão

É preciso viver com cuidado. Preocupando-se a cada passo, sem que isso atrapalhe a fluência natural do movimento da vida. Deixar as coisas acontecerem no seu tempo, na sua suavidade - sem perder o controle, sem empurrar toda a responsabilidade do fazer acontecer pra longe de si mesmo. Ainda que seja difícil demais viver nesse mundo... Nesse mundo onde as pessoas te procuram por conveniência. Nesse mundo onde se caminha pelas ruas com medo. Nesse mundo onde sempre se espera que algum dissabor aconteça repentinamente, afinal, a dor da decepção já acomodou-se integralmente em nosso corpo. Nesse mundo onde os sorrisos são admirados não pela sua pureza, mas pela sua raridade...
Um mundo onde se é carregado pelas idéias da população maciça que te pisoteia ao andar apressada pra chegar Deus sabe onde... Que vivem unicamente com a vaga ocupação eterna de nascer e morrer, sem aproveitar a fundo um sequer dia desse intervalo que lhes foi concebido. E mesmo que não se queira doar sua vida pra esse lugar obscuro que te faz esquecer que ainda existe algo de bom, a força do empuxo é bem maior que se imagina. Se você tem uma meta, é um em um milhão. Se existe alguma pretensão realmente positiva, de tentar fazer o que se tem vontade mesmo que seu maior sonho seja humanamente impossível, orgulhe-se. Muitos passaram por aqui. Alguns fizeram história. Não história mundial, pra serem lembrados e celebrados seus ideais séculos afora. Fizeram história em sua própria vida. Levaram sepultadas as lembranças de uma vida sentimentalmente saudável e a certeza de nunca ter se esquecido de abrir um sorriso nas mais simples situações cotidianas. Fundamentalmente, o melhor caminho é sempre esse. Leveza no coração, sinceridade no olhar, profundidade nas palavras e uma boa dose diária de gargalhadas que ecoam nos ouvidos alheios causando mais e mais gargalhadas, e assim sucessivamente, como uma cadeia infinita de doação direta da mais sincera alegria. Pra se viver com ternura, sem perder a compostura contente de quem gosta de viver, em meio a toda essa loucura, um método interessante... Criar-se um mundo próprio. Autônomo. Anexo. Independente do mundo real. Respeitando cada detalhe do interno e do externo. Sem misturar as coisas. É a famosa história do "eu-queria-que-fosse-assim". Queria que meu cabelo fosse mais liso, minha pele mais macia, meus olhos mais claros. Queria ganhar na loteria, queria uma casa grande, queria um carro de causar inveja. Queria não ter que acordar cedo. Queria não precisar fazer metade das coisas que me foram impostas. Mas elas foram, de fato. E algumas têm de ser seguidas à risca.
Queria trocar de vida com alguém, como em algum filme interessantemente utópico que devo ter visto um dia. Queria. Queria. Queria. Queria... Do verbo "não posso querer porque tá fora do meu alcance" ou "é mais fácil viver num querer eterno do que procurar fazer por onde". De fato, existem coisas que, se colocadas num universo parelelo, fogem à realidade e acabam machucando... Coisas translúcidas que, ao longe, nem conseguem ser distinguidas. Coisas que trazem expectativas não-saudáveis, calcadas em fatos que jamais serão possíveis. Como trazer de volta alguém amado que já partiu pro outro lado desse mundo em chamas. Como curar corações com feridas tão profundas que se tornam crônicas com o tempo... Como querer mudança sem buscar mudar. A maioria do que precisa acontecer depende mais de nós mesmos do que de qualquer outro fato alheio. Parece absurdo porque passamos muito mais tempo com outras pessoas (que têm mais "poder" sobre cada um de nós) do que tentando descobrir quem nós somos, o que queremos, do que gostamos. Acabamos pautando nossas escolhas e objetivos refletindo-nos em vidas externas que em realidade não terão muita serventia se não houver nem um pingo de vontade própria. E passamos a vida fazendo o que o mundo todo faz... Sem se preocupar com o que os habitantes do nosso mundo, esse que é só nosso e que esteve conosco a todo tempo, querem que seja feito de nossas vidas.
Esse mundo interno que é uma confluência de "órgãos" imaginários que, juntos, dão origem a um espaço magnífico. Talvez seja formado por coração, alma e mente. Nessa ordem. Pra que os sentimentos sejam a posição mais alta na pirâmide, a alma seja o filtro de linha fina que só deixe passar as melhores coisas e a mente esteja ali pura e exclusivamente pra organizar as funções de cada vontade ou idéia dos habitantes do seu próprio mundo.
A conexão do seu com o meu, e com o dela, e com o dele, talvez possa transformar esse universo despertencente em algo que queira ser trazido pra perto. Se a sua base for o amor, a minha o respeito, a dela a gentileza e a dele a harmonia, não precisaremos nada além.
Chegará uma hora em que os mundos estarão todos conectados em transversalidade. Juntos, cruzados, apoiando-se um no outro.
Como deve ser. Como sempre deveria ter sido.


"Como é doce morrer nesse mar, de lembrar... E nunca esquecer
 Que se eu tivesse mais alma pra dar, eu daria... Isso pra mim, é viver."

quinta-feira, 17 de maio de 2012

Cumulus Nimbus


Que venha devagar e sempre
Se em cada gota traga uma imensidade de sonhos bons
Ou ruins, se traga junto a estes esperança para seguir em frente
O barulho da nostalgia acalme cada coração agitado dos belos dias ensolarados
Que roubam toda beleza que há de se ver também nos pingos gelados dessa precipitação
Lavando almas, renovando ciclos
Desmoronando vidas e reerguendo pensamentos
Quando leva embora a luz e deixa só a insossa escuridão
Ao mesmo tempo cheia de vazios preenchidos com idéias claras
Que não se tem vez de pensar enquanto nossos olhos iluminados estão.

Não é de bom grado se ausentar tempo demais
Já que tudo o que vem do céu há de ser sagrado
Se as nuvens já não carregam tua água vital
É certo que o sol alegrias pressupõe
Quando um céu azul anima manhãs em massa
E a escuridão ao acordar aflora desgosto no levantar
Por entre lençóis e travesseiros
Lamenta-se a presença dos pingos firmes e ligeiros
Saibamos tão lindas serem as coisas agraciadas pelos raios do sol vindos
Mas que nos seja fácil perceber a beleza deste conjunto de lágrimas que caem do céu
Aliviando nuvens e fazendo brotar tantas flores que dependentes lhe são.  

Tanto quanto seja possível um dia claro em sol
Ser desbotado pela incessante queda das moléculas vítreas
Dessa substância essencialmente viva
Possível seja reconhecer a atuação pluviométrica
No presente que nos é concedido ao posterior deste espetáculo descrente
A etérea beleza dos arco-íris
Tão frágeis que se vão sorrateiramente
Apenas para nos lembrar de lembrar
Que não há de se ver sempre a faceta do raio que destrói
Mas por vezes o lado bom da chuva que cai
Onde a beleza se encontra desmeteorologicamente
Dentro de cada um que queira vê-la florescer
Independentemente se a chuva, o vento, o sol
Faz viver, faz brotar, faz amar, faz morrer.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

Juventude (?) Perdida

Certa vez li uma reportagem de um colunista da revista Época cujo título dizia, num tom desesperado: "O que mais dizer aos jovens?"
Comecei a leitura com a esperança de que fosse algo positivo, do gênero "o que mais dizer aos jovens para que continuem firmes e fortes" ou alguma coisa animadora, reanimadora, estimulante. Engano... "O mundo está perdido nos dias de hoje" era a frase basilar que deu margem a toda baboseira ali redigida. Como se os horrores do universo tivessem surgido no século XXI, na modernidade, na contemporaneidade. Há de se convir que sim, existe uma atualidade jovial que segue resquícios de um passado inesquecível. Mas, repito: resquícios de um passado inesquecível. Não foi um bando de jovens revoltados que escravizou metade da África por acreditar que os negros não tinham alma. Hitler não se encontrava no auge de sua adolescência perdida quando matou os alguns milhões de pessoas que, segundo ele, despurificavam a raça. Tampouco as Ditaduras da maioria das regiões foi feita por pessoas novas desprovidas de discernimento. Há um contraponto: os guerrilheiros, militantes, os heróis das nações, esses sim, eram jovens. Perdidos, alucinados, fora de si. Mas com um propósito e um foco que nem a tortura conseguiu afastar: a liberdade. A democracia, a justiça. Muitas vezes e muitos deles, pelo simples prazer de revolucionar, de tentar mudar. Ou de bagunçar, tumultuar, piorar. Mas há os que orgulham a nossa raça, sendo eternamente heróis de pouca idade... Longe de ter pouca experiência. Olga Benario ingressou no movimento comunista com 15 anos. Anne Frank escreveu um diário que comoveu o mundo de norte a sul, também com 15 anos. Che Guevara foi um dos principais ideólogos e comandantes da Revolução Cubana de 53, com 25 anos. Tanto no Estado Novo em 37 quanto na Ditadura Militar de 64, no Brasil, a maioria da força da guerrilha era formada por estudantes, que têm inclusive o respeito pelo nome da UNE (União Nacional dos Estudantes), onde muitos morreram sendo torturados mas lutando pela democracia até a última gota de sangue. A jovem americana Jan Rose que, usando de sua ousadia de adolescente pensava colocar uma flor no cano da arma de um dos soldados a sua frente durante o protesto anti-Vietnã, tinha 17 anos. As Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colombia) têm uma atuação não muito passível de admiradores, mas, ainda assim, é uma força de guerrilha que luta contra o governo colombiano formada por jovens de às vezes até mesmo dez anos de idade, sem força física ou mental, que são obrigados a deixar suas famílias pra lutar a favor de seu ideal... A princípio, forçados. Num segundo momento, buscando um objetivo liberal, pautado no socialismo.
Bom... Na conclusão, aconselho pensar duas vezes antes de abrir a boca pra reclamar da sociedade atual. Existe muita barbaridade no mundo. Muita. Feitas também por pessoas no auge da idade, que um dia já foram jovens, é claro. Mas cometeram suas atrocidades depois de certa experiência adquirida.
Os jovens estão perdidos? NÃO. Se existe algum grupo que pode salvar essa humanidade suja de sangue e afogada em lágrimas, somos nós. Com toda a certeza, não utilizando de meios como matar uns aos outros pra implantar ideologias ou preferências religiosas. Mas se expressando através da música, da arte, do estudo, do esforço, da dedicação...
Nós temos força suficiente pra mover o mundo.
"Nenhum de nós é tão forte quanto todos nós juntos."
Pelo amor à uma geração heróica, nem tão perdida quanto alguns gostariam que ela fosse.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Infinito Carnaval

Não é muito sensato no ser humano o fato de esperar trezentos e sessenta e cinco dias pra pular de alegria por apenas três ou quatro dias em um ano. Esse clima descompromissado agrada e atrai a atenção da maioria, mas junto com isso, uma boa dose de felicidade vem embutida no pacote. É sério que isso tem que ser assim? Ironicamente, carnaval é época de se esconder atrás de máscaras e sair pulando na rua... E verdadeiramente, é a época onde todos nós jogamos as nossas máscaras no chão e brincamos a alegria de viver, nesse cenário despropositado de cantar marchinhas e seguir a massa. Mas, essa é uma pergunta interessante... Por que esse fenômeno sensacional de felicidade só acontece (em sua maioria) nos míseros dois, três ou quatro dias de carnaval? Por Deus... No carnaval, sorrimos pra cinco pessoas a cada esquina, damos bom dia pros moradores de rua, torramos no sol e andamos quilômetros em meio a enormes multidões sem reclamar de nada, gargalhando e transbordando de felicidade ao fazer isso. E por que não fazemos isso o resto do ano inteiro? Seria inimaginavelmente agradável se durante os doze meses do ano, as pessoas percebessem o quanto a vida é maravilhosa, o quanto nascemos com a incumbência de sermos foliões da hora que acordamos até a hora de irmos dormir... O milagre da vida é pra ser celebrado a cada segundo. Sem depender de serpentinas, confetes, ceias de Natal ou fogos de Réveillon. Se você consegue respirar sozinho, brinde. Se você consegue andar com suas próprias pernas, festeje. Se você consegue ouvir a risada de uma criança e se emocionar, comemore. Se você consegue sorrir apenas por sorrir, sem algum motivo ou comemoração especial, continue sorrindo até que seus músculos faciais não possam mais suportar. Deixe que a alegria colorida do carnaval invada seus dias sem dó, como o sol que te desperta iluminando a janela pela manhã. Ou a chuva. Porque afinal, a felicidade é um sentimento absolutamente independente. Vamos abolir a quarta-feira de cinzas das nossas vidas e "não ter a vergonha de ser feliz" não só no meio da multidão foliã... Mas sempre que você se olhar no espelho e tiver a capacidade de entender como é maravilhoso ter sido abençoado com a vida e com todas as coisas boas que ela veio lhe trazer... Ou as ruins, que com certeza, lhe trarão coisas melhores um dia. Aliás, assim como os defeitos do carnaval, toda vida tem seus prós e contras. Quando tiver que ir trabalhar no sol e andar no meio da massa trabalhadora de terno e gravata, se imagine num bloco imenso de carnaval. Sorria pra cada uma delas como se estivessem comemorando algo. Ou sorria pra si mesmo... Mas não se esqueça de sorrir. Nem por um segundo sequer. E viva a alegria eterna da folia carnavalesca! :)