segunda-feira, 25 de julho de 2011

Vivo

Difícil não é amar e ser amado. Difícil é amar com a mesma intensidade e reciprocidade aquele que te ama. Difícil não é viver no sofrimento. Difícil é convencer a ti mesmo a se conformar com as coisas ruins que acontecem e sempre irão acontecer, a fim de isolar de uma vez por todas o que te faz sofrer. Difícil não é estudar o dia todo. Difícil é ter sede de aprender e ser incapaz até disso, por alguma deficiência física, mental ou mesmo financeira. Difícil não é ser casado com uma mulher feia. Difícil é encontrar uma mulher que, sendo bonita, feia, magra ou gorda, vá te fazer se sentir satisfeito sem precisar olhar pra mulher do vizinho. Difícil não é ter cinco filhos chorando em seu ouvido. Difícil mesmo, é ter o sonho de ter apenas um e não poder... Difícil não é acordar às quatro e meia da manhã pra trabalhar. Difícil é se sentir impotente por não ter condições nem de sair pra tentar colocar comida dentro de casa. Difícil não é julgar os outros. Definitivamente, não. Difícil, de verdade, é estar ali, na vida de cada um, passando pelos mesmos amores e desamores que lhes pertencem. Difícil não é amar as pessoas. Difícil é aceitá-las com seus prós e contras, entendendo que negativos e positivos fragmentos também fazem parte de nós. Difícil não é achar a melhor profissão. Difícil é entender que a perfeição não existe, e que em todo caminho há obstáculos, sejam estes grandes ou pequenos. Difícil não é ter saudade. Difícil é não ter tido oportunidade de aproveitar até a última gota da pessoa que se sente falta. Difícil não é sorrir. Difícil é perceber que o sorriso espanta quaisquer males que possam vir a embaçar teu caminho. Difícil não é chorar. Difícil é ter tantas mágoas, mas tantas, que estas acabam virando teu próprio consolo, e te impedem de derramar uma sequer lágrima. Difícil não é sentir frio no inverno. Difícil é não parar de sentir frio nunca. Difícil não é abrir os olhos pra enxergar os males do mundo. Difícil é manter os olhos abertos, e não ter a capacidade de enxergar nem as cores, nem as pessoas, nem as flores, nem o sol. Difícil não é ouvir insultos e ter que ficar calado. Difícil é querer ouvir qualquer som que seja e não poder, e querer responder até a algum elogio, e as palavras ficarem eternamente presas em sua garganta, sem que você queira. Difícil não é odiar alguém. Difícil é conseguir odiar uma pessoa depois que você a conhece, e percebe que ela também tem uma história pra contar. Difícil não é morrer. Difícil é olhar para trás e ver que ainda tinha tanta coisa a ser feita. Difícil não é viver... Difícil é querer viver. Sem reclamar, sem chorar, sem odiar, sem insultar. Sem medo de morrer. Apenas viver. Viver vivendo, viver sorrindo, viver amando. Viver querendo viver. Viver pensando, no fim: A vida é mesmo tão difícil que não possa ser vivida com avidez por viver mais a cada segundo? A resposta nem é tão difícil quanto parece...

domingo, 24 de julho de 2011

Multiplicando os Divisores

Confesso que não compreendo de verdade essa admiração subjacente que as pessoas têm pelas figuras dos heróis. Ficcionalmente, pessoas admiráveis e admiradas, que salvam o mundo em dois minutos com os super poderes que lhes foram concedidos. Nesse labirinto intransponível de expectativas ascendentes, sonhamos tanto com esses ditos poderes, que acabamos por não reparar o quão heroi cada um de nós, é. Evidentemente, generalizar neste caso, é sinônimo de irrealidade. Existem vilões por aí que, literalmente, não estão no gibi. Nem a ficção poderia imaginar mentes tão ávidas por maldade, que não se contentam apenas em dominar o mundo, mas têm por objetivo destruí-lo a cada dia. Em contrapartida, há o lado dos mocinhos. Somos verdadeiramente heroicos. Conseguimos partilhar nossos mil quatrocentos e quarenta minutos diários para realizar atividades inadiáveis, no sufoco corrido das horas que não dão trégua nem por um milésimo de segundo. O relógio não pára, nem para folga do almoço. É... A maioria de nós acaba por viver nessa intensa correria de trabalho, estudo, comida, filhos, pais, vida, morte. E ainda almejamos com afinco a idéia de nos serem concedidos super poderes - é absurdo. Nos multiplicamos infinitamente para reduzir o tempo das resoluções, por dia. As mães, de uma, transformam-se em cinco. É roupa pra lavar, feijão pra escolher, arroz pra cozinhar, bife pra limpar, mochila pra arrumar, banho pra dar, filho pra vestir, escola pra levar. Os pais, lá de longe, têm três reuniões antes do almoço, quinze minutos pra almoçar, cinco segundos pra escovar os dentes, e o resto pra resolver quarenta mil coisas que têm de ser entregues ao final do dia. E qual é a surpresa? Eles fazem isso vendados. Não é de se admirar? Os filhos estão (quase) sempre alimentados, de barriga cheia. Chegam no dia seguinte com o trabalho de casa prontinho, a roupa impecavelmente limpa e engomada, com o cabelo e as unhas cortados e bem tratados. Inacreditavelmente, isso é feito sem a ajuda de nenhuma varinha de condão. Realmente, eles são herois. Nós, os estudantes. Numa proporção menor, precisamos também nos multiplicar pra dividir nós com nós mesmos, as tarefas do dia. Provas, trabalhos a entregar, monografia pra terminar, namorado pra fazer as pazes, cartão de crédito pra pagar até as 16:00h, juros do cartão de crédito que não deu pra pagar e não tem dinheiro, conversar com o pai explicando que realmente não deu tempo de ir ao banco ontem... É uma luta diária. Se tivéssemos o poder de voar, de escalar as paredes com teias, de nos esticar metros e mais metros, de ter a força de um leão, e ficar invisíveis de vem em quando, talvez não fizéssemos isso tudo com tanta destreza, como fazemos de fato. Exatamente por termos que aprender a contar apenas com nosso corpo pouco preparado para salvar o mundo, é que nos prendemos no nosso mundo, e somos assustadoramente capazes de fazer de TUDO pra fazer nossa vida não parar de andar. A anatomia do nosso corpo foi desenhada com uma perfeição indefectível, para nos ajudar a entender nossos limites e quando é a hora de parar de salvar nosso pequeno infinito particular. Talvez a nossa maior criptonita seja a idéia de não conseguir resolver por completo as funções que nos foram dadas. É o que nos deixa fraco, desanimados, sem força para seguir em frente e mostrar pra nós mesmos que nós somos capazes, sim. Pode ser que esse calvário de enfrentar a vida de cabeça erguida sem a ajuda de super poderes não seja tão duro assim. Na verdade, os sorrisos amarelos dos trabalhadores que saem de casa, já na labuta, às 5 da matina e voltam muito após o sol desaparecer, são os maiores incentivos para a conclusão de que nossos super poderes nasceram com a gente. Cada um tem o seu. Seja lutar contra o tempo, voar nas horas pra conseguir ver o seu filho acordado, seja ficar invisível para os desânimos, ou escalar as maiores montanhas de dificuldade com as próprias mãos. E nós os manifestamos, a cada dia, dentro de nós mesmos... Aos poucos, mas devagar e sempre. Acredite.