segunda-feira, 27 de dezembro de 2010
Coalescência, Combinação, Concordância
O fenômeno da união é realmente um assunto muito interessante a se pensar. Em alguns casos, ele necessita de alguns pré-requisitos muito básicos pra que possa acontecer. Famílias que se fazem distantes, por exemplo - e não digo distantes em quilômetros, mas distantes em sintonia, em sentimento. A união entre algumas só acontece em datas especiais e comemorativas, como por exemplo o Natal. Ao final do ano, é um bom exercício reparar como é bom estar junto a família. Mesmo que muitas vezes o pensamento seja negativo em ficar ouvindo os parentes distantes dizerem que você cresceu muito, que ficou lindo, que seu nariz é mais parecido com o da sua mãe, mas os olhos são do papai. Ou você ouvir todos aqueles assuntos que não dizem respeito a absolutamente nada que lhe interesse, e sente uma vontade gigante de sair daquela sala chata e estar em qualquer outro lugar do mundo que não seja ali. Tirando essas sensações chatinhas, que fazem parte afinal, de todo o contexto, o que ocorre é que, pelo menos aos meus olhos, que são malucos na maioria de suas visões e percepções, esse fenômeno em sua estrutura é simplesmente lindo de se ver, da maneira que for. Independentemente de Natal, Ano Novo, Páscoa ou Dia das Mães, a união deveria acontecer sempre. Em todos os 365 dias do ano. Ela é caracterizada pela preocupação e cuidado que você tem simultaneamente com todas as pessoas que você ama, e reciprocamente, o cuidado que elas têm com você e umas com as outras. Cuidado de ouvir, de ser amigo, de estar ali do lado pro que precisar. Ela não precisa acontecer apenas entre os membros da família, no seu sentido próprio, apesar de a família ser o órgão mais importante do seu sistema como um todo ao longo de sua vida, por ser o primeiro grupo de pessoas com quem você tem contato. Todavia, você adquire várias outras famílias ao longo de sua caminhada. Ao entrar no colégio, ganha tias, amigos que viram irmãos, irmãos de amigos que viram primos, e assim por diante. Na formatura, ganha padrinhos. Ao decorrer desse tempo que você passa convivendo com pessoas diferentes e encantadoras, cada uma ao seu jeito, você sente algo tão forte e especial por algumas, que tem vontade de tomá-las como parte do sangue que corre em suas veias. E a partir daí, considera-os como família. Eu não critico a união apenas às datas comemorativas porque para alguns, elas são as únicas oportunidades inclusive de estarem unidos aos outros; Por questões profissionais, temporais, etc. Então, elas acabam sendo importantes para que haja um pretexto onde a família precise estar reunida. O problema é deixar que essa união se esvaia no dia seguinte, e você se esqueça do quanto sua família e a união entre os membros desta te deixam feliz e satisfeito. Acho um fenômeno interessante pois, mesmo de longe, as pessoas que você puxa pro seu laço familiar ou as que já fazem parte deste naturalmente, não te deixam se sentir sozinho, jamais, quando a união verdadeiramente existe. Num momento de solidão que não seja saudável e deixe-nos cabisbaixos, é neles que devemos pensar pra nos sentir melhor. A união é confortável. Ver as pessoas entrosadas, amigadas e entretidas umas com as outras, dá uma plena sensação de felicidade, se essas pessoas fazem parte do seu ciclo afetuoso. Por isso uma vontade louca, às vezes, de que seus amigos da escola virem amigos dos seus amigos da faculdade, e do seu prédio, e do seu curso de inglês; Quando você junta num círculo só todas as pessoas que você ama, a cautela, o amor e o carinho que elas sentem por você, se fortalecem, trocando energia umas com as outras e revitalizando todos esses sentimentos. Contudo, existe a união daquelas pessoas que não se conhecem. E essa, pra mim, é a mais bonita que há. Pelo simples fato de que o sentimento floresce naturalmente. Você não se une a pessoa porque ela é da sua família, é sangue do seu sangue. Você se une a ela porque ela é tão ser humano quanto você, merece tanto quanto você estar aqui, compartilhando do mesmo mundo, das suas dores, das suas alegrias, tanto quanto você. E esse entendimento de que a união em si, na verdade não precisa de NENHUM requisito básico pra acontecer, é um sentimento que ultrapassa a beleza de todos os outros sentimentos juntos. Quando você entende que você ama só porque ama, ou você quer estar junto de algumas pessoas só porque quer estar, sem nenhuma necessidade essencial, é quando você, sem saber, une todos os sentimentos existentes dentro de você e sente algo que ainda não se definiu. Pode ser que isso que nós sentimos seja só esse espírito de união, do qual me refiro, e que se dá através dessa sensação de querer puxar pra perto de você todas aquelas pessoas que você tem vontade de dobrar e guardar num potinho, ou de pendurar no seu quadro de imã, pra você nunca esquecer que ainda existem pessoas extremamente especiais nesse mundo. Isso, não se compra com ovos de Páscoa, ceias de Natal e muito menos fogos de artifício no Ano Novo. Quando você entende o sentido disso tudo, você passa a enxergar a união como algo que necessita fazer parte do seu dia-a-dia, acolhendo-a como uma velha amiga, e querendo ensinar a todas as pessoas as quais você quer estar unido que, estar junto é uma simples troca de energia e amor, baseada na harmonia que os seus sentimentos bons conseguem ter com os sentimentos bons das pessoas que você ama. Piegas, porém intransponivelmente certo: A união sempre fez, faz e continuará fazendo a força.
terça-feira, 7 de dezembro de 2010
Milagrosamente Vivo
O milagre, em seu entendimento, é uma coisa diretamente relacionada à divindade, ou a algo que diga respeito a ela, em via de regra. A palavra milagre, em sua fonte significativa, fundamenta uma intervenção divina, como uma dádiva dos céus. Mas.. se é assim, e para os descrentes, não há milagre? Não digo os descrentes no sentindo atrelado à religião na sua origem. Digo os descrentes de forma genérica. O que caracteriza um milagre, afinal? Algo extraordinário, incrível, impossível? É uma explicação que se deturpa cada vez que algum de nós tenta explicar, com nossas palavras tortas e entendimentos incompletos, talvez. Já ouvi diversas vezes a expressão "o milagre da vida"; que ao meu ver, significa o milagre do nascimento, o milagre de estarmos aqui, vivos, racionais, de carne, pele, osso, e para alguns, de espírito também. Penso ser um pouco evasiva essa significação. Não que a minha opinião faça algum sentido pra mais alguém além de mim mesma, é claro. Mas acredito que o mais grandioso milagre que possa vir a ser, é o da existência. A existência das coisas, a existência de tudo. De cada planta, de cada inseto, de cada cor, de cada sonho, de cada palavra, de cada vontade. Será que tudo isso não é o maior milagre que pode existir? A vida, de fato, é um milagre. Mas não no nascimento e na morte. E sim em sua jornada. Cada peculiaridade, é um milagre. Cada flor vermelha que nasce em meio a uma mata toda verde, é um milagre. O fato de ninguém nesse mundo inteiro ser igual a ninguém, é um milagre intransponível. Cada órgão do nosso corpo, cada centímetro, nos é único. Existimos de forma singular. Incontestavelmente singular. Em jeito, aparência e coração; pensamos, falamos, agimos. Somos seres humanos, com uma inteligência que supera qualquer tipo de tecnologia existente. Isso, indubitavelmente, é um milagre. E ainda há os que passam a vida esperando cair um milagre do céu. O milagre da salvação, o milagre da volta. Esperas, milagres e decepções. E perdemos tanto tempo esperando pelo tal milagre, que esquecemos de observar as dádivas que existem à nossa volta. O vento batendo no rosto.. É uma sensação única, difícil de explicar: é incolor, inodoro, não tem forma. Apenas nos causa uma plena sensação de alívio, de purificação, de frescor espiritual. Por mais que não saibamos, no fundo, o mais próximo da definição é isso. O milagre das cores.. Como conseguem ser tão únicas? Não há explicação para o que é o azul, nem o amarelo, nem o rosa. Qual é o mais bonito? Cada um deles é lindo, em sua forma de colorir. Milagres não significam apenas coisas inacreditáveis que nos acontecem ao dia-a-dia. Costumamos usar esse termo ao falar de coisas raras, que quase não acontecem.. Sem perceber que tudo - absolutamente tudo que nos rodeia é envolto de uma dose única de encanto, que não se iguala a nenhuma outra coisa. Pode ser até que não seja uma coisa boa. Mas é um milagre. Existindo, é um milagre. De onde veio, como começou, onde começou? Existem trilhares de explicações. Religiosas, históricas, científicas. Mas.. qual é a verdadeira? Nunca vamos saber.. e acho que, nesse caso, a melhor saída é guardar pra si a própria percepção do que realmente acontece nesse fenômeno da vida, que nos cerca desde o momento da nossa concepção até o nosso último suspiro dela. Cada minuto que passa, é incrível. Cada dia que deixamos pra trás, pelo fato de ser único e não voltar nunca mais, se faz incrível. O tempo passa, a cada milésimo de segundo.. E as flores vermelhas murcham, o vento pára e volta, as cores perdem o encanto. A cada dia, tudo se renova. Milagrosamente, se renova. E passamos cada minuto do nosso dia pensando no próximo dia, pensando no milagre que é a vida do nosso vizinho da frente, porque a casa dele é enorme, a família dele é linda.. e nossa vida é sempre a mais infeliz e sem graça, comparada a de alguns. A existência e o tempo são as únicas coisas indefectuosamente democráticas. Nascemos nas mesmas condições. Existindo, postos no mundo - e tendo 24 horas por dia: pra chorar, pra sorrir, pra viver do jeito que couber a cada um de nós. Esse jeito, essa maneira de levar a vida, é um milagre. Cada um segue um caminho, e é feliz do seu jeito. O milagre da vida é caracterizado por quantos sorrisos você consegue dar por dia, ao meu ver. Sem discurso hipócrita, é o que realmente eu acho. A vida não é medida por quantos anos você viveu. As pessoas costumam achar que são vividas por quanto elas já sofreram.. o que importa, na verdade, é que elas são vividas porque agora riem de tudo o que já sofreram um dia. O poder do sorriso, é um milagre. A sensação que nos proporciona uma gargalhada, não se compara com nenhuma outra sensação do mundo. Será que ainda assim nos cabe algum tipo de espera por qualquer milagre? Acho que a única espera que tenho em relação a isso, é que cada um perceba quão especial é a vida que vivemos, do jeito que for vivida, se for sofrida ou feliz, é a vida, e só existe uma. E esse milagre.. é uma chance única de perceber quantos milagres nos pertencem. É um milagre que não volta nunca mais.
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
Ensaio sobre a Cegueira
Ao longo desses seis mil quinhentos e setenta dias de vida, eu aprendi bastante. Didaticamente falando, ou não. Tive muitas professoras, e ainda tenho, com as quais aprendi muito, não só em matérias escolares, mas principalmente sobre a vida. Mas, costumo sempre enfatizar que meus maiores professores sempre foram e sempre vão ser os meus pais. Cada um do seu jeito, cada um me transmitindo o que um dia meus avós os transmitiram, me transformaram numa pessoa constituída de mais coração do que qualquer outra coisa que pudesse ser. Os dois, apesar de a minha educação ser formada por eles, juntos, tinham um jeito distinto de me ensinar as coisas. Minha mãe de uma forma mais rígida, por ser o jeito dela, mas sempre com um olhar reconfortante na hora dos conselhos. Meu pai, mais grudento e carinhoso, mas com um nó na garganta e um peso no olhar na hora das broncas. Na hora de me coibir a certos atos, ou me ensinar a fazê-los, os dois também tinham um jeito diferente. Sempre que minha mãe me dizia pra fazer ou não alguma coisa eu perguntava o porquê, e na hora ela me explicava com a maior calma e amor do mundo. O meu pai, sempre teve um jeitinho meio sei lá de fazer isso. Como ele mesmo diz, ele sempre me "empurrou no abismo", e continua empurrando, diga-se de passagem. A expressão quer dizer que ele sempre deixou mensagens soltas no ar, em vez de me explicar o que elas queriam dizer, deixava que eu procurasse o entendimento sozinha. Isso me fazia pensar e pensar mais sobre o assunto, de forma que mesmo descobrindo o que ele queria dizer com aquilo, eu continuava pensando nele. As duas formas, foram muito eficazes. Numa dessas de me empurrar no abismo, uma vez ele empurrou tão forte, que nunca mais eu parei de cair. Alguns assuntos nos quais ele me inseria, me deixaram até hoje meio indignada, de forma que às vezes eu não consigo encontrar respostas pra certas (muitas ou quase todas) as perguntas. Uma vez estávamos na praia: eu, ele e mais uma amiga minha que de tão amiga virou quase filha dele. Eu devia ter uns doze ou treze anos, e nessa época, geralmente as meninas ficam numa fase de transição criança-adolescente que incomoda muito, e que faz fechar os olhos e o coração pra muitas coisas que não podemos parar nunca de enxergar. Bom, a lembrança é vaga, mas acordei pensando nela hoje, e tentei buscar indícios pra lembrar do dia como um todo. Se não me falha a memória, nós duas falamos alguma besteira perto dele que o fez pensar, e tomar a atitude de fazer o que fez. Nós chegamos na praia, costumávamos ir cedo. Eram mais ou menos oito horas da manhã de um sábado ensolarado. Não tinha chegado ninguém ainda, dos que ficavam com a gente, então ele pegou a brecha e aproveitou a oportunidade. Levou nós duas pra beira do mar, e nos sentamos, os três. Ele começou a contextualizar um assunto que me deixou totalmente saturada, ele discorria sobre desigualdade. Não social, mas desigualdade na forma genérica. E ele misturou uma coisa com a outra, mandando a gente reparar em cada coisa que existia na praia. Como o mar era bonito, como a linha do horizonte era irrefutavelmente reta sem nenhum defeito, como a areia era confortável, como as pessoas eram diferentes, e como essas diferenças eram belas. E ele começou a falar das pessoas que não têm capacidade pra enxergar essas diferenças. Começou a falar sobre os cegos. Sobre como era injusto nós conseguirmos enxergar aquilo tudo, e ainda conseguir procurar algum motivo para reclamar, de qualquer coisa que seja. Depois do mini-discurso, ele fez um 'exercício' com as duas. Mandou-nos fechar os olhos, e ficar cinco minutos de olhos fechados. Disse que era pra sentirmos como eles se sentem. Foi me dando um nervoso, quando me dei conta de que não conseguia enxergar as cores, não enxergava as formas. Podia ouvir tudo, o barulho do mar, a risada das crianças, as pessoas correndo na areia.. e eu não podia enxergar nada. Foram os cinco minutos mais incapazes de toda minha vida. Mas por outro lado, os que me mais me fizeram pensar. A partir daquele dia a minha visão sobre as coisas mudou um pouco, me vi mais compreensiva em alguns aspectos. Só que, de uns tempos pra cá, meus pensamentos sobre esse dia se recaíram sobre outra perspectiva. A cegueira por vezes, é algo voluntário. Não a cegueira na forma da doença. Há muitos nesse mundo que preferem fingir-se de cegos. É bem mais confortável, nas circunstâncias atuais, fechar os olhos, ao invés de querer enxergar todos os problemas pelos quais temos passado. Eu confesso, já pensei em fazer isso. São tantos erros, tantas decepções, tantos absurdos. A visão é uma dádiva, uma coisa privilegiada, é claro. Agradeço todos os dias por ter meus sentidos perfeitos. Só que vendo tanta coisa, dá mesmo vontade de fechar os olhos e fingir que tudo é belo. Quando você não enxerga nada, você desenha um mundo que é só seu. Ele é intocável, imutável. Ainda mais, por aqueles que nunca tiveram a oportunidade de enxergar nenhum dia sequer. Cada um monta o seu mundo, com as cores mais marcantes, as pessoas mais bonitas, os problemas mais superficiais. Os muros não são pichados. As crianças pobres, não andam com roupas rasgadas feito panos de chão. As ruas não são repletas de lixo, e as favelas, nem existem. É claro que os que não enxergam, deixam de ser realistas. Não são utópicos a ponto de não saberem do que se passa. Mas pelo menos, conseguem usufruir do conforto que é não ter que olhar pra toda essa burrada e enxergar, com todas as cores,todas as letras, todas as dores, todos os males. Elas ainda podem, dentro da visão delas, sonhar com um mundo melhor. Não se torna tão impossível enxergar uma melhora, quando seus olhos não te deixam ver. Ou, quando você prefere não enxergar. Por mais que seja necessário se conformar com toda essa dor pra conseguir sobreviver nesse mundo que infelizmente é real, perante certas situações, dá vontade apenas de fechar os olhos pro problema, de tão difícil e complexa que se torna a solução. É uma atitude mais que covarde, eu sei. Muito covarde mesmo. Mas desanima. Desanima sério ver que um em um milhão se preocupa com tudo isso. Vale ressaltar que isso não é um discurso moralista, nem um apelo, nem um pedido, nem uma carta ao presidente. Talvez um texto qualquer. Ou um desabafo, quem sabe. Queria poder usar dessa dádiva só pra enxergar as coisas boas. E também não teria graça. Só se sabe o que é bom quando conhece o ruim. Ou não. Nesse caso não. Queria eu às vezes, poder escolher ter visão seletiva. Mas talvez fosse ruim, porque eu ia escutar demais. Ia sentir demais. Mais do que já sou compelida a sentir. Os sentidos outros iam ser mais aguçados, e não teria tanta eficácia quanto o esperado. Eu admito que não tenho vontade de ser uma pessoa fria. A visão, ela é vista de vários pontos. Não é só enxergar no sentido figurado que cito nesse texto. Cada um tem uma maneira de fazê-lo. Mas às vezes os meus olhos me machucam tanto.. por vezes sinto muito orgulho deles. Por conseguir fazer pelas pessoas o que alguns não fazem - uns porque não querem, uns simplesmente pela falta de sensibilidade. E geralmente as pessoas me dizem, que eu tenho uma forma diferente de ver as coisas. Com clareza, com paixão. Pode ser que eu tenha sim, depois desse dia em que tive que, mesmo que por curto tempo, ficar sem enxergar algumas das coisas belas da vida. Mas na beira da praia, é mole. Queria ver ao pé de uma favela. Ou em um país muito pobre, em meio a uma família passando fome. Talvez eu pedisse a meu pai para me deixar ficar mais tempo de olhos fechados. Mas essa não é a realidade, o meu mundo não é suficiente pra suprir as dificuldades que o mundo real oferece. Talvez seja melhor tomar a atitude, mesmo que sendo dolorosa, de abrir os olhos, e encará-lo de frente. Dói, machuca, decepciona. Mas faz aprender, mudar. Faz a gente dar valor pro nosso mundo, dar valor pra nossa falta de problemas. Porque por mais que todo mundo os tenha, é claro que existe uma certa diferença entre eles. Enquanto pra uns o maior problema do mundo é a prova que vai ser feita daqui a duas semanas, para outros o problema é abrir o armário da cozinha e não ter nenhuma comida para o jantar do dia seguinte. E o que temos a fazer? Não adianta ficar fingindo que tudo está correndo da mais perfeita maneira, porque seria total hipocrisia de nossa parte. A verdade é que, a cada dia, a situação fica pior. E a cada dia, dá menos vontade de enxergar, e ao mesmo tempo, precisamos fazê-lo. E é por isso que, eu não paro de cair nesse abismo sem fim... Não consigo achar nenhum tipo de resposta pra pelo menos metade das perguntas que tenho em mim, e transformo esse abismo numa cegueira infindável.. Por mais que estejamos todos de olhos abertos, parece que as pessoas estão dormindo. Todas. Me dá vontade às vezes de deitar nesse travesseiro gigante que elas dormem, e fazer o mesmo simples papel de mais uma vivendo porque tem que viver. Mas não, eu não consigo. Meus olhos doentes não me deixam enxergar tudo da mesma maneira. Infeliz ou felizmente, não. Na verdade, gosto deles. Eles cuidam do meu coração. Sabe quando dizem que os olhos são a janela da alma? Então, é a mais pura verdade. Eles expressam o que a alma quer dizer, e não pode. Conseguem ao mesmo tempo, ver toda a dor que se passa pelo mundo, e ainda assim, enxergar daqui a alguns anos, quando as pessoas vão acordar e se tocar de que estamos perdendo tempo deixando de ver muitas coisas das quais deveríamos, e com certeza todas elas contribuirão pra uma melhora do mundo de uma forma geral. É uma visão literalmente futurista. Bem sonhadora. Meus olhos me fazem assumir dois personagens nessa vida: uma que consegue manter os pés no chão e tenta fazer o máximo que pode pra ajudar de seu jeito, e a outra, que por mais que não deixe de enxergar a realidade, consegue sonhar com um dia em que todas as outras pessoas tenham a oportunidade de ganhar um par de lentes, como o que ela ganhou, pra enxergar o que ela enxerga, sonhar o que ela sonha, ouvir o que ela ouve. E esse presente, sem dúvidas, foi o melhor que ela já pode ter ganho. A oportunidade de enxergar esse mundo com um tipo de cegueira que, por incrível que pareça, lhe torna alguém com pensamentos bons, positivos, e o melhor de tudo: esperançosos.
quinta-feira, 4 de novembro de 2010
Preferencialmente Essencial
Quando ouvimos falar na palavra essência, em seu sentido próprio, entendemos como o núcleo de algum determinado assunto. A essência é o assunto, propriamente dito, em sua origem de importância. Até quando nos referimos à essência de um perfume, esta significa sua marca principal, seu núcleo na forma dita sobre a sua essência em si. E na verdade, muitas das vezes, não damos importância ao que realmente existe de essencial. O núcleo e a principalidade das coisas às vezes tornam-se superficiais em detrimento do que deveriam, e acabam tomando uma forma não tão importante, quando na verdade, é a única coisa que de verdade importa. O essencial da vida, não é quanto você ganha, quanto você perde, quanto você chora. O que realmente importa, é o quanto você se alegra com as coisas que faz com quanto você ganha, os benefícios que suas perdas te trazem, a quantidade de coisas que você aprende com as suas lágrimas. O essencial está escondido por trás do aprendizado. Por trás da felicidade que ele te traz, e por trás de todas as coisas que ele te proporciona. Os fatos que nos ocorrem, em sua superficialidade, enchem nossa cabeça com coisas que pouco ou nada nos acrescentam, e tomam nosso tempo, um tempo que poderíamos estar aprendendo mais e mais, de forma a nos deixar indignados, tristes, cabisbaixos. E o essencial, com certeza não é esse. O que realmente importa não é quanto tempo você fica preso no trânsito, no caminho do trabalho, e sim a boa vontade que você tem de se deslocar todos os dias do recanto do seu lar, pra ir ganhar a vida de uma forma digna. Não importa quão seja difícil a sua faculdade, e se suas notas não vão bem, o essencial é que você todos os dias acorda com mais vontade de melhorar, e aprender. Eu sei, essas duas últimas frases podem parecer um pouco hipócritas. Mas sério, não deveriam. Se colocássemos na ponta do lápis quanto tempo passamos tentando arranjar uma culpa pra colocar em alguém quando alguma coisa de ruim acontece, ficaríamos com ódio de nós mesmos. Porque a culpa, ela não é essencial. Pra que nos isentarmos dela e simplesmente depositar nossa raiva/tristeza/insatisfação em alguma coisa ou em alguém que não a tenha, realmente? E fazemos isso. Infelizmente, acontece em períodos diários. Ao invés de tirarmos proveito do ocorrido e pegarmos pra nós o que ele tem de bom, nos preocupamos em achar desesperadamente alguém que tenha culpa, porque é bem mais cômodo fechar a cara para o problema, do que remar contra a maré e tentar achar o lado bom da coisa, pra tentar, a partir daí, procurar a essência que forma o acontecimento. Mais uma vez, é mole na teoria, mas na prática não é bem por aí. Somos humanos, feitos de carne, osso, e apesar de coração, há uma série de malícias que aprendemos com o tempo, que nos protegem (ou pelo menos achamos assim) de certas coisas, usamos os nossos erros como uma capa protetora para que estes não aconteçam mais, e com o tempo, começamos a desconfiar demais das coisas, e ao contrário do que deveria acontecer, nos vemos saturados de certas coisas e estas nos machucam com mais facildade do que antigamente. A essência do aprendizado se perde, o essencial se torna superficial, e mais uma vez, perdemos nosso tempo com o que não importa na verdade. Devemos a cada dia, encarar os fatos com outros olhos, olhando de fora, como se pudéssemos deixar o nosso corpo e subir a um nível onde possamos ser imparciais o suficiente pra enxergar as coisas com clareza. A essencialidade é por fim, vista, e daí aproveitamos o que aquilo tem de bom pra nos oferecer. Eu sei, é um emaranhado de informações, mas não é tão difícil quanto parece. Afinal, o essencial não é a dificuldade, mas sim os artifícios que você usa pra entender que a dificuldade em si, é só mais um obstáculo, como outro qualquer, e que você tem capacidade suficiente para passar por ele, com a cabeça erguida, enxergando sempre o melhor que a essência das coisas que, sendo boas ou ruins, têm a lhe oferecer.
terça-feira, 26 de outubro de 2010
(Des)Crenças
Existem muitas. De todos os tipos, para todas as idades, de toda sorte de gosto que pode haver nesse mundo. Cada um acredita em algo, e nem sempre a palavra crença é atrelada a religião, apenas denomina-se crença alguma coisa ou alguém que outro alguém acredita. Algumas crenças são tão inerentes a nós, que é difícil nos desvencilharmos delas a certa altura da vida. Por outro lado, há algumas que adquirimos ao longo desta, e que nos fazem deixar de acreditar em várias outras crenças anteriores. Geralmente isso acontece quando a crença deixa de ser apenas algo abstrato, que apenas fica no pensamento, e passa a invadir o mundo real, ou seja, quando aquilo que você acredita realmente acontece, ou algo que anule completamente o que você acreditava acontece, e você deixa de acreditar. As crenças religiosas trazem à sociedade grandes conflitos que nos fazem pensar. Antigamente, éramos coibidos ao ato de pensar, e de questionar, por isso a crença era algo mais homogêneo, muito mais unânime. Ou talvez nem fosse, mas as pessoas tinham que fazer parecer que sim. Tínhamos/temos medo de expressar o que sentimos em relação à religião. Agora, venhamos e convenhamos: quem nunca duvidou da existência do ser divino a que todos acreditam e se referem, que atire a primeira pedra. Não é possível que enxergando todos os dias essa dor enorme existente no mundo, não nos perguntemos se existe realmente um Pai Nosso que ajude a todos nós ao mesmo tempo. Não há e nem nunca haverá uma resposta certa e não passível de mudanças e dúvidas. Não critico a religião, mas não concordo com sua doutrina. Apenas a respeito, e a seus seguidores. Só acho que é uma forma de impôr verdades absolutas (que não existem em nenhum lugar do mundo), com a desculpa da retribuição divina na próxima vida. O que não pode acontecer, é deixar de tocar sua própria vida e dar nas mãos de uma figura divina, seja lá qual seja, para que ela a faça. A partir daí, perdoem a falta de jeito, mas vira plena patetice. Mas não cabe a mim discutir e opinar sobre coisas que não acredito. As crenças, de forma geral, podem ser boas ou ruins. No sentido de serem boas, são às vezes, confortáveis, como a da religião por exemplo. É melhor pensar que vamos pra um jardim lindo e colorido se passarmos a vida indo à missa todos os domingos, do que não ter a mínima idéia do que vai acontecer quando passarmos desta pra melhor. É menos intrigante acreditar nas coisas que sempre nos foram ditas, desde os nossos primeiros anos de entendimento vital, do que tentar entender sozinhos e morrer numa chuva de "porquês", "comos" e "ondes". Pois bem, existem crenças que nos deixam indignados, em seu lado negativo. Coisas que não conseguimos deixar de acreditar, mesmo que essas nos machuquem e nos deixem desconfortavelmente incomodados. Tipo você acreditar que o amor da sua vida, só vem uma vez. Essa é uma crença que nem sempre é saudável demais. Se você vive com esse tal amor, te faz bem. Mas a partir do momento que você não o tem mais, se torna um carma, e você se prende a isso de tal forma que não se entrega à vida para que ache outros amores. Acreditar, por exemplo, em fantasmas, espíritos ruins, te faz pensar em mil e uma coisas na hora de dormir, e muitas vezes nem te deixa em paz para que você possa fazê-lo. Mas quem disse que conseguimos deixar de acreditar? Não há luz acesa, nem beijo de boa noite, nem coberta em cima da cabeça que faça deixar de ter medo dessas coisas. E, infelizmente, ou não, não há quem mude aquilo que decidimos acreditar, e isso permite que nossos pensamentos não sejam unificados, de forma que passem a convergir ao mesmo ponto, caracterizando mais uma vez, as nossas diferenças. Cada um com sua crença, cada um com sua descrença, com sua falta ou com sua religião. Acreditar é algo que faz parte da vida, nos baseamos na crença para que possamos viver. Não é só crer em um fato, ou em uma história. É crer que o que você acredita é realmente a sua verdade. O que a Bíblia, os livros, os papas, os oráculos, os monges, os nossos pais, nossos antepassados impõem, não tem absolutamente nenhuma relação direta com a verdade. A maioria do povo acredita num lado, e nem por isso você é obrigado a concordar. Em nenhum aspecto. O bom é contrariar, não por motivo de simples rebeldia, mas por coragem. Contestar é uma virtude. Não existe nenhuma certeza nessa vida além da morte. Portanto, sinto muito se alguns acreditaram nisso por toda vida, mas a melhor saída não é aceitar o que te impõem e apenas deixar que isso te angustie a cada dia. Ou pode ser, até, pra aqueles que não possuem a coragem de questionar, e de ir a fundo em cada assunto. Talvez seja mais inteligente não acreditar em nada. Ou acreditar em tudo, quem sabe. Concorde com tudo. Acredite na religião, mas não desacredite na ciência. Reze para Deus, mas visite Jerusalém periodicamente. Vá a missa todos os domingos, mas não esqueça de fazer aquelas besteiras diárias que seus companheiros denominam pecados. Não adianta, se você toma por absoluta uma verdade, mais cedo ou mais tarde vai acabar se contradizendo. Então.. na verdade o melhor caminho a se seguir não existe, depende de cada um. O caminho que você acredita, é o melhor. Independente do que te falem, do que tentem te convencer. Quem tem que acreditar com todas as suas forças, é você. No dia em que você se interessar inexplicavelmente por um assunto qualquer, e sentir uma vontade insana de estudar sobre ele loucamente, vai saber que acredita nele com uma força maior do que todas as outras coisas que acreditou antes. Como eu fiz com esse assunto. Acreditar é algo que se faz ao longo de todos os dias. Você dorme acreditando que vai acordar vivo amanhã. Se não fizer isso, sua vida não anda. Mas não deixe nunca de questionar, de contestar, de ir a fundo em cada centímetro daquilo que você acredita - isso funciona, e muito. Não se sinta mal se um dia você deixar de acreditar em algo que todo mundo acredita. E se um dia você resolver expressar em sua descrença, todos se virarem contra você, e te perguntarem o porquê dessa contestação, a resposta é uma só: você é alguém com muita personalidade.
{Escrito com grande ajuda do maior amigo do mundo, através de muitas discussões, conversas, vídeos, fotos, e etc., Pedro Feital}
{Escrito com grande ajuda do maior amigo do mundo, através de muitas discussões, conversas, vídeos, fotos, e etc., Pedro Feital}
quinta-feira, 21 de outubro de 2010
Mais uma lição..
Talvez a decepção seja um dos piores sentimentos capazes de se sentir na vida. É um buraco sem fim, um vazio sem final, que te empurra no abismo sem querer deixar que você volte.. O pior é que pra ela não tem cura, ou pelo menos, ainda não encontrei. Por mais que você consiga esquecer temporariamente a dor da decepção, sempre que lembrar dela estará decepcionado como nunca esteve antes. Decepcionado além de tudo, por não ter conseguido ainda esquecer. De repente não haja um remédio, mas uma solução prévia. Andei imaginando uma, pra evitar de me sentir assim mais vezes. Estando decepcionados com alguma coisa, é óbvio que há um sentimento bom que o antecede. Se ficamos decepcionados, é porque acreditamos em algo, e este não aconteceu com o sucesso que esperávamos.. Ou, às vezes, pode ser que nem tenha acontecido. A expectativa é uma coisa gostosa de se sentir. Ela se faz presente na maioria dos sentimentos bons, e é ela que tira nosso sono à noite, quando pensamos no que fazer no dia seguinte em relação a alguém, por exemplo, e a reação que esse alguém vai ter diante a nossa atitude. Planejamos tudo. O tom da voz, a cor do sorriso, a textura do abraço, até as mínimas palavras. Fazemos muito, mas como podemos fazer? É confortável pensar que toda reação alheia vai ser positiva em relação a uma atitude nossa, e em virtude disso, criamos a tal da expectativa. Geralmente acontece comigo nas provas. Estudando muito, ou não, coloco toda minha esperança naquela folha de resposta. Saio mega confiante, mesmo que sabendo que no fundo não fui tão bem assim. Nossa, e como me faz mal quando o resultado não é o esperado. Você se culpa, xinga seu ego, e se deprecia por ter sido tão idiota a ponto de acreditar que aquilo realmente iria acontecer. E se decepciona com o acontecido, e consigo mesmo. Portanto, como tudo que eu já vi nesse pequeno tempo de vivência, a expectativa também tem seus prós e contras. Quando ela é referente a uma pessoa, se torna simplesmente burra. Pelo simples fato de que nos é impossível ler o pensamento alheio. Como vamos antecipar um acontecimento proveniente do pensamento de outra pessoa? Hoje nem sabemos o que nós mesmos vamos acordar pensando amanhã! Imagine na cabeça de qualquer um que seja. Pensei nisso de montão. Como se na prática fosse tão fácil quanto na teoria. Não que seja algo inalcançável, mas é bem difícil.. É quase que involuntário. É inerente a nós guardar pelo menos um pouco de otimismo na cabeça, apesar de saber que este muitas vezes, sem que percebamos, já nos fez sofrer por várias vezes. O melhor mesmo é deixar que as coisas aconteçam naturalmente, sem querer interferir em nada. Sem tentar adivinhar o que vai acontecer, o que você vai ter vontade de falar na hora, o que a pessoa vai lhe responder, quanto tempo vocês vão ficar conversando, se a conversa vai ser produtiva, e assim sucessivamente. Desculpe se estou sendo uma pedra no seu sapato, mas a expectativa é simplesmente ineficaz. Só serve pra que você se decepcione até com a chuva que cai no dia seguinte, quando você dormiu pensando naquele sol maravilhoso que com certeza ia te deixar com o bronze mais lindo do mundo no dia de amanhã. Aí você acorda com aquele barulhinho maravilhoso da água batendo na janela, e, em vez de aproveitar o que realmente está acontecendo, se prende ao que ontem você gostaria que tivesse acontecido. A ordem natural das coisas é a coisa mais linda que existe, sem interferências, sem expectativa. Não digo que você tenha que ficar exteriorizado aos acontecimentos que te rodeiam, a ponto de não querer que tudo dê certo. Mas não exija que tudo saia exatamente como você planejou. Porque não vai ser assim. E mais uma vez, você vai se decepcionar. Talvez, do jeito que tiver que acontecer, vai ser muito mais bonito, completo e colorido do que você imaginou. E aí, acontece ao contrário: você se sente feliz com aquilo. Quando você não põe expectativa, a coisa flui melhor do que você esperava, e aí, você se sente radiante. "Nossa, foi bem melhor do que pensei". Posso estar falando besteira, mas ao meu ver, é muito mais inteligente. A sensação da surpresa é muito mais gostosa. Se prevêssemos tudo o que fosse acontecer, nos decepcionaríamos com a falta de novidade que iria nos cercar. Acho que tive poucas decepções na vida. O ser humano tem mania de só parar pra pensar em determinado assunto quando algo referente ao assunto acontece. Não escrevi isso porque sou uma pessoa frustrada com a vida, é claro que não. Sempre penso que as coisas vão dar certo. Mas tenho em mim a consciência de que, se não for do jeito que pensei, vai ser melhor ainda. E se não for, eu dou um jeito de ficar. Não adianta ficar depositando tudo na coitada da expectativa. Quem faz a cor, o brilho, o sol, a chuva, as palavras, os sorrisos - é você. Você e só você. Quando você descobre que a matéria-prima da sua felicidade é o seu interior, nenhuma expectativa se torna ineficaz, e as decepções, que tanto te incomodavam, agora têm até o seu lado bom: lhe servem como lição.
sexta-feira, 15 de outubro de 2010
Inconstante
Porque pensava, porque vivia, porque ouvia, porque errava, porque aprendia, porque falava, porque cantava, porque escolhia, porque queria, porque fazia, porque sonhava .. Sentimentos constantes eram simplesmente exteriores à ela, que tanto mudava, dia após dia. Mudava rápido de idéia, de vontade, de opinião. Não que fosse volúvel, e que não tivesse personalidade sólida, era apenas muito suscetível ao movimento da vida, que consequentemente trazia muitas mudanças a ela. Caracterizava-se a si própria como um ser permanentemente mutável, que, por mais que às vezes não quisesse, estava sempre mudando. Às vezes era bom, pois não deixou nunca que a vida a levasse, sempre tinha controle sobre ela, e fazia da sua própria vida o que bem entendia, sem deixar que ninguém interferisse nas suas escolhas. Mas por vezes, ela se sentia incomodada, pois achava que nunca estaria satisfeita com nada. Algumas coisas lhe aconteceram em seu pouco tempo de vida, e essas coisas lhe fizeram aprender muito - aprendera sobre pessoas, sobre sentimentos, sobre erros, sobre perdões .. Aprendera a dar valor a certas coisas que nunca havia percebido ter valor antes. Houve uma época em sua vida, em que tudo era perfeito. Os pássaros cantavam mais alto, os dias eram ensolarados mesmo debaixo de chuva forte. O cheiro que sentia era sempre agradável, a música que ouvia sempre era a melhor melodia do mundo. Acordava a cada dia com mais vontade de viver, ia se deitar para dormir louca para logo acordar, a viver mais um dia com tanta alegria. Essa felicidade que sentia, era plena. Foi o único momento de sua vida, que se sentira constante. Constante no sentido de ser feliz. Aquela felicidade era imutável, ninguém tirava dela. Foram 730 dias de pura plenitude. Não sabia explicar o porquê de tanta felicidade. Ela só sentia.. Os dias eram tão perfeitos, cada acontecimento se encaixava com perfeição. A vontade de viver florescia no seu coração como as flores na primavera, e a alegria disso tudo até tinha um motivo, e ela sabia exatamente qual. Todos sabiam. Ela exalava essa alegria. Os dias passavam de forma explêndida, e nada a incomodava. Sua inconstância não a perturbava, se sentira completa, como se nada pudesse mudar sua vontade de estar ali. A vida se tornara mais fácil. Os momentos difíceis eram bonitos, as escolhas complicadas eram fáceis, as atitudes eram tomadas com a maior certeza possível. Se sentia segura, amada, plena, feliz. No entanto, infelizmente nesse momento, a mutabilidade que era uma característica inerente à ela, começou a incomodar seus pensamentos. E aos poucos, sem perceber, começou a destituir essa plenitude, e quando foi perceber, já não era mais feliz. Tanto fez, que conseguiu. Aprendeu que às vezes, é preciso sossegar e dormir aos braços daquele momento que mais te deixa feliz. Nem sempre é preciso mudar a toda hora. Aprendera que aquele momento, um momento de pouco mais de 730 dias, fora o melhor de sua vida. E um dia, de repente, acordara com o tempo nublado. E dia seguinte também. E no outro também nublado. Todos os dias o eram, mesmo que debaixo de um sol de quarenta graus. Todas as músicas eram enjoativas, menos as que mais tocaram nos 730 dias. As vozes alheias eram desagradáveis. A comida perdeu o gosto. As pessoas eram simplesmente monótonas. Todas, sem grau de exceção. Os dias ou eram muito frios, ou muito quentes. Não existia clima ameno. Até as aulas de História do Brasil, de que tanto gostava, perderam o tom. A vida perdera a cor, o brilho, a claridade. Os cachorrinhos pelo chão, perderam a graça. Os livros que amava ler, as coisas que costumava fazer, só tiveram amor, nos 730 dias mais felizes e completos da sua vida. Ela não era mais ela. Queria descobrir o porquê daquela tristeza, mas não conseguia. Planejava uma forma de consertar tudo, de voltar no tempo. Por mais que todos dissessem que era impossível, ela pensava contra o mundo, e tentava, tentava, tentava. Caiu, levantou, e as feridas não fechavam mais. Aquela ferida, do maior erro que cometera, não fechava, não sarava, não curava. Quando ela achava que a cicatrização havia começado, a ferida sangrava de novo, sem explicação. Ela queria sair daquele poço que a arrastava pro seu fundo escuro, e roubava o brilho do seu sorriso, que sempre fora tão intenso.. Agora ela sorria sem querer sorrir. Cantava sem querer cantar, ouvia sem querer ouvir, falava sem querer falar. Acordava sem vontade de viver. Sonhava acordada de dia, e dormindo à noite com a mesma coisa. Não tinha mais vontade de contar suas conquistas, muito menos suas derrotas. Não da mesma forma que nesses 730 dias. A esperança a machucava a cada dia. Não conseguia mais curtir o presente, pois só pensava no futuro. Só conseguia pensar em ser feliz novamente, quando conseguisse retomar à sua vida esses dias que lhe foram tão felizes. Lembranças, fotos, músicas. Telefonemas, conversas, promessas. Todas essas matérias-primas da esperança que sentia, pinicavam sua vontade de viver todos os dias. Da hora que acordava, à hora que ia dormir. Ela queria esquecer, pra viver melhor, mas não se permitia. Fora tudo tão perfeito, que não queria nem pensar em esquecer. E mesmo que quisesse, não conseguiria. E mais uma vez, não sabia explicar o porquê. Ela só sentia.. E sente. Ainda sente, ainda dói. Ela quer mudar, quer usar sua inconstância pra conseguir ser feliz de novo. Mas não muda. Muda de ambiente, muda de opinião, muda de gosto. Mas nunca muda de amor. Nunca se desprende desse passado lindo e colorido que lhe entristece mais e mais. Os ares novos que compõem a sua nova vida não têm o poder de tirar da sua cabeça o erro que cometeu, e que acabou pra sempre com a maior chance que tivera, de ser plenamente feliz. Há 455 dias ela se sente assim. Quando vê as pessoas tão felizes, tão completas, tão amadas. Sempre que vê, sua ferida sangra mais. E o sangue não estanca, nunca. Seu coração, durante esses 455 dias, adquiriu sérios problemas na coagulação.. Há 455 dias ela acorda com dias nublados, com o sorriso amarelo. Ao se olhar no espelho consegue enxegar nitidamente o arrependimento. E a cada dia, ela quer mudar. E sua mutabilidade a deixou na mão. A traiu. Deixou-a no chão, sangrando, sofrendo, sem nem lhe dar a mão para que possa levantar e seguir em frente. Nem pra abraçá-la quando acorda de madrugada com seu travesseiro empoçado pelas lágrimas. Pra pegar na sua mão e encorajá-la a levantar a cada manhã, pra tentar sorrir de novo. Ela agora está sozinha.. E a esperança não a abandona. As lembranças, são suas únicas amigas. Só elas. Elas são as que, nos momentos de tristeza, a fazem lembrar que um dia fora a menina mais feliz desse mundo. Por isso, ainda lhe resta lá no fundo uma mínima vontade de acordar todos os dias. Pela segunda vez na sua vida, ela tem um sentimento constante: a culpa.
domingo, 3 de outubro de 2010
ENC:(Sem assunto)
A ausência de idéias iniciais pra escrever, talvez possa parecer um bom motivo para fazê-lo, visto que o melhor jeito de começar um texto, na minha humilde concepção, é não ter a mínima idéia do que se escreve. Não no tocante ao assunto que se trata, é claro que pra defender determinado ponto de vista, precisamos ter conhecimento sobre tal assunto, mas não necessariamente a sistematização da estrutura do texto. Apenas a idéia central é suficiente para que o texto flua com naturalidade. Geralmente começo escrevendo sobre nada. A criatividade é uma figura crucial na escritura, mas não é ela a principal. Só tenho um esboço vago do que vou escrever quando vou contar uma história, que já é algo fixado pela memória.. Fora isso, começo sempre com um texto (sem assunto). Ao contrário do que deveria, o título é o que escrevo por último, depois de ter organizado todas as idéias e no final, ter conseguido assimilar finalmente qual é o assunto do texto que acabo de escrever - porque só o consigo no final. Enquanto escrevo, não sei quem sou, não sei o que escrevo, não sei de onde vêm todas as idéias, toda habilidade, toda destreza.. Simplesmente desconheço a procedência de todas as citações anteriores. A única coisa que sei, é que escrever é o que mais amo fazer. Não sei como comecei, nem onde, nem quando, nem por quê. Mas amo. Ao terminar, e ler, muitas vezes nem acredito que fui eu que escrevi. Não por falta de modéstia, evidentemente. Apenas porque não lembro de onde vieram as idéias. Escrevo com tanta paixão, que as palavras florescem de forma que não sinto. Quando percebo minha tamanha empolgação, estou no final do quarto parágrafo, e aí me desespero porque vejo que escrevi demais. Não que seja um mal, mas em textos grandes, geralmente a idéia central se perde; você fala sobre diversas coisas, e o assunto inicial já não é mais o mesmo que norteia o parágrafo final. Expôr suas idéias num papel, não é a mesma coisa de expressá-las usando o dom da fala. Na oratória você tem a facilidade de articular as palavras com os movimentos da voz, tenta expressar pela fala exatamente a imagem que te passa na mente. Ao escrever, não é assim que a banda toca. Às vezes penso até em deixar de escrever por ter um assunto na mente, aliás. Se torna tão impossível de transformá-lo em palavras, que quase desisto, deixando-o só na idéia. Mas a fome de utilizar todas as palavras conhecidas por mim pra tentar de vez expressar o que penso é tanta, que escrevo. Mesmo que não fique bom. Escrever não é só um modo de mostrar que você sabe. Não é só um meio através do qual você enriquece seu vocabulário. Nem mesmo uma ferramenta que se usa pra convencer alguém de alguma coisa decorrente da habilidade nítida que se vê, por exemplo, a de escrever. Escrever é uma terapia. É uma forma de tentar entender a si próprio. Escrevendo, você é obrigado a organizar suas idéias de forma a compactá-las e entender de uma vez por todas que raio de pensamento é esse que tanto te aflige dia após dia. Não tendo alguém que te entenda nessas aflições, a arte de escrever sempre te é solícita. As palavras são, de longa data, minhas melhores amigas. É nelas que deposito minhas dores, e alegrias, e histórias, e admirações. É com elas que me entendo. É por elas que tenho grande carinho, elas são as que preenchem minhas tardes vazias (quando as são). Um dia se me pedissem para descrever a sensação de ler um texto meu, eu não saberia fundamentar a resposta. É uma sensação única. De orgulho, satisfação, alívio. Quando você escreve realmente com sentimento, transmite-os às pessoas leitoras dos seus textos, e, se você próprio é uma delas, consegue entender-se. Envolve as pessoas nos laços entre as palavras e os sentimentos, entre as dores e os verbos, os amores e as concordâncias. Fácil ter habilidade na gramática. Saber de cabeça todas as definições complicadas de orações subordinadas, coordenadas, e suas adjacências. Não sou formada em faculdade de Letras. Tampouco pretendo. O que tenho em mim não é habilidade, nem conhecimento da estrutura de uma redação. O que eu escrevo é repleto de vida, de amor. Não é sistematizado nem bolado um dia antes. É improvisado, na mesma hora em que é transformado nessas palavras. E o melhor presente que posso ganhar com eles, é ver que minhas palavras fazem algumas das pessoas que lêem, encantadas - seja por orgulho, compreensão, ou apenas admiração. Minha relação com as palavras é das melhores possíveis, e é por isso que tenho tanta paixão por elas. Por saber que elas me confortam, e me prendem num mundo onde nunca são elas insuficientes para caber no limite das minhas idéias, da minha história, das minhas paixões. Deposito aqui, nesse texto, bem como nos outros todos que já escrevi e hei de escrever, todo o amor que houver dentro de mim, e principalmente, todo o amor que eu encontrar dentro do meu mundo.
terça-feira, 28 de setembro de 2010
Todo amor que houver
Recebê-lo, é muito bom. Um gesto de amor, uma gentileza, um beijo, um abraço, um agrado, um presente. Coisas que nos deixam felizes, que nos façam sorrir. É bom, sempre muito bom. Mas tão bom quanto, e quem sabe até mais, é praticá-lo. Corresponder um sorriso, doar um abraço, dar um presente. Gratificante, na verdade; principalmente quando o receptor percebe o quão felicitado está sendo, e consegue retribuir com pelo menos um sorriso de atenção, de obrigado. É engraçado quando chega perto do aniversário, por exemplo, de alguém muito querido.. Queremos ser os primeiros a dar parabéns, começando por ligar na meia noite do dia anterior; ou até mesmo quando compramos o presente uma semana antes e contamos os dias para que possamos entregá-lo. Isso é decorrente da certeza que temos, que nos conforta muito fazer bem aos outros. E não só às pessoas que conhecemos: é preciso fazê-lo até mesmo aqueles que nos são desconhecidos. Por que não? Todos somos dignos de recebê-lo. Todos temos dores diárias, e somos possuidores de virtudes incríveis, de modo a sermos parabenizados uns pelos outros frequentemente. E isso se dá através desses agrados. Nos sentimos estimulados a pensar que somos boas pessoas, ao recebermos certas palavras de afeto, ao recebermos coisas boas de pessoas com quem convivemos, ou até mesmo de quem nunca tivemos contato antes. Aprendi em toda minha vida a fazer o bem. Um dia, quando pequena, estava no mercado com meu pai.. Ele passou por um moço e deu boa noite, e eu sem entender, perguntei se ele conhecia. E ele majestosamente, mais uma vez, me respondeu:'Não, nem nunca o vi. Mas todos somos dignos de um boa noite.' Hoje, sorrir para pessoas na rua e dar boa noite para desconhecidos é uma atitude de plena normalidade, ao meu ver. Comecei a pensar que, há pessoas nesse mundo que estão sozinhas.. E sozinhas, mesmo. Sem ninguém, pra receber um presente, um beijo, um abraço, e até mesmo um boa noite. Ouvindo um boa noite de alguém que nunca tenha visto, talvez por alguns segundos possa pensar que, na verdade, ela não está tão sozinha assim. E dessa forma, podemos talvez transformar a solidão da pessoa em uma alegria momentânea, que seja. Quando puder, faça isso. A melhor retribuição possível vai chegar até você em algum momento. Aquelas frases que vemos no orkut, entituladas "Sorte de Hoje", pra mim parecem irrefutavelmente patéticas. Porém, um dia fui surpreendida com uma que dizia:'O melhor presente que se pode dar é um abraço. Ele é tamanho único, e ninguém vai se importar se você quiser devolvê-lo'. Não são exatamente as mesmas palavras, mas a essência é essa. Presentes são sempre ótimos de serem devolvidos. Sejam abraços, beijos, elogios, palavras - todos as lembranças que pudermos dar às pessoas. Quando fazemos mal a alguém, é claro que esse alguém ficará ansioso também para devolver-nos nossa infeliz atitude, portanto, cutucar os outros de forma errada não é hospicioso.. Bom, mas isso é mais uma forma de te convencer a praticar o bem. Entretanto, você e só você tem que se convencer disso. Faça todo o bem que puder. Sem esperar nada em troca.. Um dia, ele volta quando você menos espera, e felizmente, dez vezes melhor do que o dia de quando você o mandou. Talvez, no dia que o receber, esteja precisando muito. Assim como fez questão de fazer o bem, aquele dia, àquela pessoa que estava realmente precisando dele.
"A alegria de fazer o bem é a única felicidade verdadeira." (Léon Tolstoi)
* [Em homenagem à Patricia Lagôas..]
"A alegria de fazer o bem é a única felicidade verdadeira." (Léon Tolstoi)
* [Em homenagem à Patricia Lagôas..]
quarta-feira, 22 de setembro de 2010
Nada
De que adianta serem lindos os jardins, se assim não os vejo? De que adianta coloridos serem os arco-íris, se para mim torna-se preto e branco tudo à minha volta? Não importa se minhas palavras se encontram num laço de alegria e gentileza, elas são secas e tristes por dentro, ao falar de você. De que adianta tentar me enganar, tentar sorrir, tentar não chorar, se a dor invade meus pensamentos quando vem à minha cabeça a certeza do nunca mais? Não adianta ter tudo nessa vida, amigos, músicas, fotos, sonhos realizados, risadas engraçadas .. Os dias se tornam iguais e vazios sem você aqui. Preciso, quero, necessito. Como o ar que eu respiro, se torna essencial essa presença impossível de você ao meu lado. A vida me jogou de um abismo quilométrico ao saber que outra pessoa toma meu lugar agora, pra nunca mais deixar que eu volte... E seu coração nem se lembra mais que um dia eu existi, de forma que caio por fim nesse abismo a não mais voltar, deixando tudo pra trás. A dor toma conta não só desse órgão pateticamente sensível e infelizmente necessário, pois se não o fosse arrancaria-o de mim, mas de todos os outros que me compõem, tornando meu corpo apenas escravo de toda essa dor que no fundo, eu fiz por onde sentir. Mereço sentí-la. De uns tempos pra cá já não dói mais, decorrente do costume, do hábito. Tenho me sentido bem, no fundo, muito profundamente. Como toda dor que de tão forte se anestesia por si só, essa se torna pífia comparada a outras dores maiores como a certeza de que nunca mais te terei ao meu lado. A certeza de que você não vai voltar. Nunca. Nunca mais. Nunca mais vou ouvir suas palavras doces ao telefone nos momentos difíceis. Nunca mais vou sorrir contigo, simultanemente. Nunca mais, da mesma coisa. Nunca mais vou sentir teu abraço caloroso e em seguida um 'eu te amo'. Nunca mais sentir teus lábios nos meus, numa dança sistematizada onde a melodia é o nosso amor. Nunca mais minha alma te sorrirá, e meu coração. Jamais outra vez. Não adianta me enganar. Eu não te esqueço e nunca vou, até meu último suspiro de adeus, que talvez possa estar chegando perante tanta dor que torce esse coração até a última gota, sem deixá-lo sequer escolher se ainda prefere viver, ou deixar esse corpo que já não é nada, sem tuas mãos pra tocá-lo, seus braços pra abraçá-lo, e seu amor pra protegê-lo. É apenas objeto. Vazio, oco, descolorido, sem alma, sorriso, coração, e principalmente, amor.
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